Morreu neste sábado (09-05-2020) o
artista potiguar Abraham Palatnik, natural de Nata-RN, nascido no dia 19 de
fevereiro de 1928. Precursor da arte
cinética e fundador da arte tecnológica no Brasil. Aos 92 anos, ele tinha sido
internado em estado grave em 1º de maio, no Rio de Janeiro, com sintomas de
Covid-19.
Filho de judeus russos, o artista se
mudou para a região que hoje corresponde a Israel aos quatro anos de idade. Na
adolescência, em Tel Aviv, estuda física e mecânica numa escola técnica.
Concilia a especialização em motores de explosão com aulas de arte e a vivência
em ateliês de pintura e de escultura.
Palatnik retorna ao Brasil aos 20
anos, desta vez indo morar no Rio de Janeiro. Lá, faz amizade com nomes como o
artista Ivan Serpa e o crítico Mário Pedrosa, com quem forma, anos depois, o
histórico Grupo Frente, ao lado ainda de Lygia Clark, Franz Weissman, Ferreira
Gullar e outros.
Outro colega fundamental na época foi
o pintor concreto Almir Mavignier. É ele que o leva para conhecer o trabalho de
arte-terapia da médica Nise da Silveira, no Hospital Psiquiátrico do Engenho de
Dentro.
O impacto de pinturas de pacientes do
local, como Emgydio de Barros e Raphael Domingues, foi definido por Palatnik
como "uma pancada" numa entrevista à Folha de 2013. "Os internos
tinham uma autenticidade incrível. Comecei a achar que jamais conseguiria fazer
pinturas tão fortes, tão densas, tão bonitas, com tanta desenvoltura, quanto os
doentes faziam."
É assim que, na transição para os
anos 1950, Palatnik abandona as tintas e o pincel para retomar os estudos da
adolescência e criar trabalhos com movimento e luz.
É dessa combinação que nasce o seu
"Aparelho Cinecromático". Uma máquina apta a gerar obras de arte, nas
palavras de Mário Pedrosa, a traquitana é composta de dezenas de lâmpadas
coloridas que se movimentam atrás de uma tela opaca. O efeito é de um teatro de
sombras abstrato, invertido.
Por insistência de Pedrosa –foi ele,
aliás, que batizou o aparelho–, a obra é inscrita na primeira Bienal de São
Paulo, em 1951. Exibida no lugar dos trabalhos da representação japonesa, que
não chegaram a tempo, ela recebe menção honrosa do júri internacional.
A máquina estimula toda a
investigação de Palatnik no terreno da arte cinética, culminando, mais de uma
década depois, nos seus "Objetos Cinéticos". Neles, o artista expõe o
mecanismo interno de funcionamento dos "Cinecromáticos". São
esculturas com arames e formas de madeira coloridas em movimento, espécies de
móbiles de Calder motorizados, ou pinturas do catalão Joan Miró que resolveram
dançar um balé.
É só na época dos
"Objetos", aliás, que Palatnik começa a ser reconhecido como um dos
precursores da arte cinética no mundo, ao lado do venezuelano Jesús Rafael Soto
ou do israelense Yaacov Agam, entre outros.
Ao participar de Bienal de Veneza de
1964, ele encantou até mesmo Miró –que pediu uma poltrona para contemplar os
"Cinecromáticos", contou Palatnik naquela mesma entrevista de 2013.
"Ele queria ficar sentado, cômodo, admirando o meu trabalho", disse o
artista "Ficou lá parado um tempão."
Mais tarde, Palatnik realiza
trabalhos que deixam de lado a mecânica e apenas simulam movimentos com
grafismos.
É o caso dos seus "relevos
progressivos". Realizadas a partir de materiais que vão da cartolina a um
composto de gesso e cola, as séries, que atravessam décadas, criam a ilusão de
movimento a partir de contrastes entre padrões, formatos e cores.
Além desses, Palatnik criou obras
interativas, pinturas em vidro, móveis, e até um jogo que, parecido com o
xadrez, busca ativar a percepção ao ter como objetivo formar o vértice de um
quadrado.
Em 70 anos de carreira, o artista
participou de cem exposições, no Brasil e no exterior. Entre elas, quatro
Bienais de São Paulo, a histórica "Mouvement 2", na galeria
parisiense Denise René, e tem obras em coleções como as do Museu de Arte
Moderna de Nova York, o MoMA, o Museu de Arte Moderna de São Paulo, o MAM, e o
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo.
Num depoimento ao Itaú Cultural há
dez anos, o crítico e curador Frederico Morais, autor de um livro sobre
Palatnik, comparou seu trabalho ao de um relojoeiro. "Se você visitar o
ateliê dele, vai ver que ele no fundo é um artesão. E que apesar de ter essa
coisa matemática, ele nunca descartou a ideia da intuição."
Já Palatnik não gostava muito de
falar do próprio processo criativo. Quando se propunha a comentar o assunto,
afirmava que tinha um só desejo: "disciplinar o caos". "Não é
difícil, não", dizia.
FONTE – DIÁRIO DE PERNAMBUCO